Sempre que chove, sinto uma nostalgia. Talvez porque o barulho da chuva no telhado seja relaxante e porque o único dia em que estou em casa para ouvir o barulho da chuva no telhado, seja aos domingos.

Se a memória fosse seletiva, ainda assim não seria vantajoso, porque alguns fatos percebidos como dolorosos, rempos depois são percebidos como aprendizado, e passam a ter um novo sentido e tudo isso só é possível porque temos como nos lembrarmos do passado.
Interessante é quando conseguimos distorcer as nossas lembranças e até mesmo anulamos aquilo que não nos interessa.
Algumas lembranças transformam-se em cenas que nada deixam a desejar para uma boa sequência de frames num filme concorrendo ao Oscar. A cada vez que as cenas são reprisadas em nada se altera a ordem dos fatos, e até ocorre um esforço por lembrar algo mais, mas nada mais é acrescentado e assim fica a cena perpetuada. Muitas delas tornam-se tão marcantes e trágicas que valem umas boas sessões de terapia e outras tantas são relembradas constantemente pelo prazer que nos causam. Mais parece que as vivenciamos a cada vez que são lembradas.
E aqueles momentos que parecem não ter importância alguma aos olhos de outras pessoas, mas que para nós é uma lembrança impar?
Quando chove e me vem essa nostalgia, viajo até a minha infância, e revejo mais um domingo com a minha familia. Pais, avós, tios, primos, todos reunidos na casa dos meus avós, almoçando, num dia quente, úmido, o barulho da chuva, vozes em tom mais alto que o normal, gargalhadas, primos correndo em torno da mesa, o tilintar de talheres, o brinde...sempre o brinde entusiasmado, e finalmente o corre - corre para os carros, para chegar em casa e dormir a "sesta"...ainda ao som da chuva e agora, no telhado.
Tenho saudades desses momentos. Tenho saudades da vida despreocupada, desse período em que tudo era brincadeira, alegria.
Como é bom poder lembrar de tudo isso. Como é bom ter tudo isso pra lembrar.
A chuva continua caindo. Vou dormir a "sesta" ao som do tamborilar da água no telhado.